Capítulo 3

APLICAÇÃO PRÁTICA

Introdução

Para trabalhar em um processo que pode originar um modelo de gestão de referência, é importante conhecer toda a teoria que o fundamenta, seus conceitos e suas possibilidades de recriação. Contudo, o complemento dessa etapa é pensar sobre as alternativas de aplicação prática, considerando os benefícios que a tecnologia pode oferecer e também as vantagens de criar ou adaptar um processo muito bem-sucedido em outra empresa, para que este seja plenamente assertivo e considere as particularidades da organização.

Além disso, é crucial olhar para um processo de RH como parte de um todo. Os processos precisam funcionar em sincronia e gerar informações e dados para alimentar os demais. Por exemplo, o processo de gestão por competências deve gerar dados para a avaliação de desempenho, e o resultado da avaliação de desempenho deve gerar dados para alimentar o plano de desenvolvimento do ciclo seguinte.

Já o engajamento é o fator que proporciona a “magia” e o sucesso dos processos. Desejar que haja ciclos exitosos sem dar foco e importância à gestão da satisfação dos empregados é impossível. O foco deve ser trabalhar o bem-estar dos funcionários para que se sintam motivados e cumpram com brilhantismo o seu papel, seja na gestão dos projetos ou processos, seja na gestão de pessoas. Esta última é o que garante o destaque e o crescimento sustentável do negócio.

Objetivos do capítulo

Ao final deste capítulo, será possível compreender:

  • as novas tecnologias e ferramentas que permitem uma gestão de pessoas mais efetiva;
  • como o fator engajamento pode ser fundamental para o aumento da performance organizacional;
  • quais são os fatores que favorecem a realização de uma gestão de desempenho de excelência.

Para melhor compreensão das questões que envolvem os objetivos acima, este capítulo está dividido em:

Unidade 1 - Novas tecnologias e ferramentas de gestão

Unidade 2 - Gestão da satisfação

Unidade 3 - Performance organizacional

Unidade 1

Novas tecnologias e ferramentas de gestão

A competição por base tecnológica, em termos de competências essenciais, transcende a competição pelos artefatos materiais e é cultivada pela geração permanente de inovação, proporcionada pela capacidade de criar e implementar novas soluções por meio de processos dinâmicos, cognitivos e sistêmicos.

Antonio Damasio (1994) reconstruiu, por meio da tecnologia, a estrutura cerebral de Phineas Gage e descobriu que a estrutura cortical pré-frontal está relacionada ao processo cerebral de julgamento e tomada de decisão, bem como é responsável pela modulação das emoções de forma a emitir uma resposta comportamental adequada ao estímulo externo. A partir de então, abriu-se um caminho promissor e inovador para vários cientistas e filósofos, que ganharam mais espaço com as pesquisas acerca das emoções.

Uma das descobertas posteriores foi que o cérebro humano tem duas idiossincrasias neurológicas que nos conectam com as pessoas fora do nosso grupo de relacionamento. A primeira envolve nosso córtex hipertrofiado, a superfície externa do cérebro, na qual ocorrem, em sua maior parte, a percepção, o planejamento e o pensamento abstrato. Algumas partes do córtex nos possibilitam desenvolver uma característica muito importante para os processos de negociação, comunicação e, sobretudo, tomada de decisões estratégicas – a chamada pelos psicólogos de teoria da mente. Ela representa nossa capacidade de imaginar o que o outro está pensando e, assim, prever as ações dele. Dessa forma, podemos nos antecipar a cenários, como elaborar um argumento plausível para uma negociação (ZAK, 2019).

A segunda idiossincrasia é a empatia, traduzida pela capacidade de se colocar no lugar do outro e apreciar seu estado de espírito. Pesquisas demonstram que a empatia aumenta quando o cérebro libera a ocitocina neuroquímica. Isso quer dizer que somos capazes de perceber com facilidade as emoções dos outros, pois o córtex frontal tem receptores de ocitocina em alta densidade. Os benefícios da ocitocina são, entre outros, a diminuição da ansiedade que sentimos quando estamos junto de outras pessoas e a motivação para a cooperação e o trabalho em equipe. Como a ocitocina modula a dopamina, que é uma substância química relacionada ao sistema de recompensa do cérebro, quando fazemos algo relacionado à interação social positiva e à cooperação, nos sentimos recompensados por uma sensação positiva de bem-estar (ZAK, 2019).

Portanto, para que a interação ocorra entre as pessoas, o cérebro constrói um modelo de prováveis ações e motivações do outro. Isso quer dizer que, de forma inconsciente, existe um jogo de confiança se beneficiando da teoria da mente e da empatia. Dependendo de como esse jogo funciona, ele pode trazer mais estresse ou motivação. O líder, então, tem papel fundamental, pois os liderados seguem o exemplo dele, mediante comportamentos baseados em valores, símbolos e respostas emocionais (ANTONAKIS et al., 2016).

Uma ferramenta muito importante para apoiar o profissional a estruturar seu plano de desenvolvimento é a matriz de competências. Nela, é possível organizar todas as competências e técnicas comportamentais e de negócio, por nível de cargo e de proficiência, bem como organizar sugestões de ações de desenvolvimento aderentes a cada competência, dentro do modelo 70% (ações de desenvolvimento práticas, com aprendizagem no desenvolvimento da tarefa, na rotina de trabalho), 20% (aprendizagem por meio de trocas de experiência com mentores, coaches e outros líderes de referência) e 10% (capacitação formal – presencial ou online, de curta, média ou longa duração, por exemplo curso de idioma, MBA, certificações, dentre outras).

Figura 1 – Matriz de competência – modelo de ferramenta

Fonte: Elaborada pela autora.

A figura a seguir representa uma visão mais executiva, para apresentar às equipes o modelo e suas possibilidades, bem como apresentá-lo aos líderes, que devem aprovar a proposta e incentivar que todos o utilizem na construção da trilha de carreira e do plano de desenvolvimento.

Figura 2 – Estruturação executiva – matriz de competência

Fonte: Elaborada pela autora.

Existem inúmeras ferramentas capazes de auxiliar no diagnóstico do perfil de cada funcionário para que a abordagem do líder, com relação à estrutura e à escolha das ações de desenvolvimento, seja a mais adequada ao momento de carreira e à necessidade atual do liderado.

A seguir, há um exemplo de esquema bem simples e útil, que pode ser confirmado por meio das discussões de carreira nos comitês, em que se mapeia cada funcionário na matriz 9 in box (que será apresentada na Unidade 3 deste capítulo). Este esquema também é muito útil para que o líder possa fazer coaching, mentoria e as próprias sessão de feedback. Ele pode ser aplicado tanto a liderados como a outros funcionários que peçam ajuda ao longo da própria jornada.

Entender o momento de cada um, suas aspirações e necessidades é muito importante para que a liderança exerça intervenções que sejam efetivas e úteis para quem está recebendo-as.

Figura 3 – Esquema – perfis X momento de carreira

Fonte: Elaborada pela autora.

Reflita

Algumas empresas usam a tecnologia por meio de diferentes sistemas de gestão, o que é muito útil para a organização. Gerir informações de carreira, avaliações e planos de desenvolvimento com um sistema permite que as informações sejam manipuladas de forma fácil, rápida e estruturada, e diminui a margem de erro. O maior benefício é manter os registros de histórico do funcionário ao longo do tempo, pois isso permite que, a cada mudança de gestão, esse histórico permaneça “vivo”, o que facilita o trabalho de todos os envolvidos no processo.

Outra possibilidade para a área de RH é usar people analytics. Por meio de uma boa gestão dos dados, cruzamento, análises e qualificação adequada desses dados, torna-se possível que o líder tenha as melhores informações para tomar as melhores decisões.

Unidade 2

Gestão da satisfação

É muito comum ouvir falar de engajamento como um fator que as empresas medem, por meio de pesquisas. Ao atingirem um nível considerado bom, conforme escalas definidas por teoria e adaptada por consultorias especializadas, as empresas usam esses resultados para fortalecer a sua marca empregadora, por meio de campanhas de marketing.

Na verdade, esta parte da cadeia deveria ser a última, uma vez que altos níveis de engajamento são consequência de uma liderança bem desenvolvida, que trabalha empenhada para desenhar e implementar um bom plano estratégico por meio das pessoas. Essa tarefa não é fácil, pois estimular a motivação do outro significa conhecer muito bem cada liderado, suas aspirações, seus desejos e seu real propósito. O líder que não conhece bem o liderado e não cria esse ambiente de confiança provavelmente falhará na prática de gestão.

Portanto, para se considerar que um funcionário seja bem-sucedido nas atividades, há um conjunto de fatores implícitos e explícitos que favorecem ou não o crescimento dele. Esses fatores passam por processos bem estruturados, pelo incentivo da liderança para o protagonismo e a gestão da própria carreira e, sobretudo, por uma base fundamental que é uma cultura que permite aos líderes e liderados que se reinventem a cada novo desafio, seja individual ou da organização.

Figura 4 – Fundamentos do engajamento

Fonte: Elaborada pela autora.

A figura anterior representa um esquema no qual o engajamento aparece exatamente no meio do estabelecimento de uma cultura que faça as pessoas se sentirem bem, na qual possam se desenvolver e possuam uma ótima relação com o gestor, e que permite a todos se sentirem pertencentes ao grupo em que atuam. Os fatores superiores são uma consequência objetiva e explícita de um conjunto de fatores subjetivos e implícitos. Muitas vezes, os profissionais não percebem a importância desses fatores e, por isso, não investem energia e foco para trabalhá-los. O resultado é que a performance e a inovação (que acabam sendo o foco primário) ficam comprometidas.

Ao longo do tempo, o conceito de engajamento foi incorporado nas organizações e fundamentou diversas teorias da Administração. A seguir, serão apresentadas algumas das mais importantes.

Maslow (ROBBINS, 2002), um psicólogo e consultor norte-americano, apresentou uma teoria da motivação segundo a qual as necessidades humanas (visualizadas como uma pirâmide) estão organizadas e dispostas em níveis, em uma hierarquia de importância e de influência. Na base da pirâmide estão as necessidades mais baixas (necessidades fisiológicas) e no topo, as necessidades mais elevadas (necessidades de autorrealização).

O neurocientista Matthew Lieberman, professor do Laboratório de Neurociências Cognitivas Sociais da Universidade da Califórnia, faz outra leitura acerca das necessidades básicas e argumenta que, para os seres humanos, mais importante do que sanar as necessidades básicas (como fome, sede, reprodução) é ter as necessidades sociais sanadas (LIEBERMAN, 2013). O autor afirma que uma liderança que tenha foco apenas nos resultados tem chances muito pequenas de ser considerada um grande líder, mas, se tiver habilidades sociais, suas chances aumentam exponencialmente. Lieberman destaca ainda que, quando realmente nos conectamos, cada indivíduo trabalha de forma a complementar as forças e fraquezas do outro. E é isso que torna uma equipe de alta performance.

O ambiente pode ser caracterizado como tudo aquilo que envolve externamente uma organização (ou um sistema). Ele é o contexto em que uma organização está inserida. Como a organização é um sistema aberto, ela mantém transações e intercâmbio com o ambiente. Isso faz com que tudo o que ocorre externamente, no ambiente, passe a influenciar o que ocorre na organização.

Como o ambiente é extremamente vasto e complexo, as organizações não podem absorvê-lo, conhecê-lo e compreendê-lo em sua totalidade, o que seria inimaginável. O ambiente é um contexto externo que apresenta uma enorme variedade de condições muito variáveis e complexas, difíceis de ser abordadas no seu conjunto e analisadas com objetividade. Portanto, a análise do ambiente deve ser feita por pessoas que ocupam posições ligadas às atividades de planejamento estratégico; outra possibilidade é a contratação de algumas consultorias especializadas, para fornecer dados presentes e, sobretudo, tendências futuras.

Unidade 3

Performance organizacional

Como visto na unidade anterior, a forma como o funcionário se posiciona dentro da organização muda substancialmente, uma vez que, no passado, ele era considerado apenas uma peça da engrenagem organizacional. Assim, para Teoria da Contingência, não existem princípios universais da Administração nem uma única melhor maneira de organizar e estruturar as organizações.

O ambiente impõe desafios externos à organização, enquanto a tecnologia impõe desafios internos. Para defrontar com os desafios externos e com os desafios internos, as empresas diferenciam-se em três níveis organizacionais, qualquer que seja a sua natureza ou tamanho:

Com isso, a forma como se avalia a performance da empresa e do indivíduo mudou, ao longo do tempo. Existem ainda, diversas maneiras de a empresa trabalhar sua gestão de performance, através de diferentes indicadores e como estes se conectam com a contribuição individual e das equipes. A figura a seguir representa um modelo de plano de metas, de forma mais macro e, cada diretoria e gerência podem e devem customizar essas metas para que cada equipe e contribuir individual saiba exatamente sua participação para a entrega de cada ação.

Figura 5 – Plano de metas

Fonte: Elaborada pela autora.

É necessário salientar que cada empresa elabora seu processo de gestão de desempenho, muitas das quais consideram a avaliação das competências, de forma conjunta.

Uma ferramenta ainda muito utilizada nos dias atuais é a 9 in box, uma matriz de avaliação cujos critérios principais são a performance e o potencial de cada funcionário.

A matriz 9 in box foi elaborada por Jack Welch, na empresa GE, para criar uma forma de classificar as pessoas de maneira um pouco mais objetiva, com base nas suas entregas e levando em consideração a qualidade, a quantidade, o impacto e como essas entregas são realizadas.

Figura 6 – Exemplo de matriz 9 in box

Fonte: Elaborada pela autora.

Quando a liderança se reúne para as reuniões de discussão da matriz 9 in box, é muito válido abrir as reuniões fazendo um resgate de todos os conceitos considerados, para que não haja avaliação divergente em termos da teoria que fundamenta cada item da ferramenta e as etapas do processo.

Com isso, gerenciar a performance organizacional significa a execução brilhante de todo um processo que envolve definição da estratégia e dos indicadores para cada nível; alinhamento das expectativas de entrega; mensuração; feedback e ações de desenvolvimento. O mais importante para a carreira é sempre fazer a correlação entre o desenvolvimento das competências necessárias para o presente e as ações para desenvolvê-las, a fim de continuar a trilhar funções com maiores níveis de complexidade e responsabilidade.

RESUMO

Neste capítulo, você pôde compreender que, ao longo dos últimos anos, a gestão das competências ganhou cada vez mais espaço dentro dos planos estratégicos da organização. É inviável pensar em um novo desenho organizacional sem pensar em quem serão os ocupantes das posições-chave; se a empresa possui esses talentos prontos para assumir o desafio; e se é necessário fazer um mapeamento externo e proativo de profissionais com o perfil adequado às novas funções.

O elemento-base que determina a senioridade dos cargos, dentro de cada tipo de estrutura, são as competências requeridas para cada nível de entrega e de desafio. Por isso, é muito relevante que a liderança tenha clareza de qual é esse conjunto de conhecimentos, habilidades e atitudes que determinará todo o trabalho de gestão das pessoas.

O ingrediente final que deve se somar ao engajamento é que os funcionários — além de estarem adequados às necessidades do cargo — devem trabalhar felizes, motivados e acreditando que a empresa da qual fazem parte lhes oferece oportunidades efetivas para continuarem crescendo e se desenvolvendo. A liderança precisa orquestrar todo esse cenário, a fim de que o entusiasmo se reflita em uma performance de excelência. Por fim, ela deve recompensar adequadamente cada membro da equipe para que o ciclo se retroalimente de forma positiva e sustentável